quarta-feira, 19 de junho de 2013

História do Povo zanata



A ENXADA E A LANÇA
A África antes dos portugueses
História do Povo zanata

...Quando os azenegues conquistaram Audagoste, a aparência da cidade – “encantadora”, segundo Ibne Hawkal – era a de um vergel. Onde os nômades, muito provavelmente, se guardaram de viver. Acampavam à sua borda, em tendas ou em precários abrigos de caniço e de ramos. Mas tinham sob controle o acesso à urbe e lhe taxavam o comércio, cuja prática deixavam nas mãos dos zanatas. 
“Gana” – ensina-nos Al Bakri, no seu famoso Livro dos itinerários e dos reinos – “ é o título usado pelos reis de um país cujo nome é Aucar.” Essa denominação real, que significava “chefe de guerra”, não era a única. Ao soberano davam-lhe também as designações de tunca e caia-maga, ou caia-manga, “o rei do ouro”.
... e grupos humanos, que lhe pagassem tributo e lhe pudessem fornecer soldados para a guerra, servidores para a corte, levradores para os campos reais. As campanhas militares expansionistas tinham por escopo, assim, conquistar gente. Mas as terras acompanhavam os novos súditos, vassalos e servos.
Parte da atividade militar concentrava-se em defender o reino de seus vizinhos – como Tacrur, Gaô e vários outros – que perseguiam o mesmo objetivo de ampliar as suas próprias redes de fidelidade política. E a maior preocupação consistia em resguardar das ambições dos berberes os portos caravaneiros da margem meridional do Saara.
Entre os berberes figuravam os azenegues, asnagas ou sanhajas, senhores do deserto, desde o uede Dara ou Dráá, ao norte, até o Sael, ao sul, e do Atlântico até o Hoggar. Os azenegues dividiam-se em grandes grupos, que, em geral, se hostilizavam mutuamente, mas podiam formar passageiras federações. Tão efêmeras, muitas vezes, quanto a paz entre as tribos de que se compunha cada um daqueles grupos. E eles eram: logo abaixo dos Oasis meridionais do Marrocos, os lantas e os jazulas; mais para o sul, os fornecedores de guias para as caravanas e seus protetores ou atacantes, os massufas; ao longo do litoral atlântico, os judalas; no Adrar mauritano e no Tagante, os lanturnas.
De rostos cobertos com um véu – que os árabes chamavam de litham - , os azenegues, com seus camelos, controlavam não apenas as rotas das cáfilas e os oásis, e os poços do deserto, mas também as grandes minas de Tagaza e outros depósitos de sal-gema, formados em depressões onde outrora houvera lagos.
Donos do sal, detinham os sanhajas a mola do comércio transaariano. Os grandes mercados, no entanto, estavam, nas cidades do sul do Magrebe, nas mãos dos berberes zanatas, e no Sael, em parte nas dos saracolês.
Na segunda metade do século IX, os azenegues assenhoreavam-se pela primeira vez do nó caravaneiro de Audagoste, uma pequena cidade, fundada talvez um ou dois séculos antes, mas que já seria um centro agrícola, artesanal e mercantil de importância, uma das principais portas do comércio com o Sudão. Daí por diante, e por muito tempo, Audagoste progrediu, até desaparecer, uns seiscentos anos depois.
Ficava – conta – nos Al-Bakri – numa planície arenosa, ao pé de um monte desnudo de qualquer vegetação. Mas ao redor da cidade havia bosques de tamareiras. E nela não escasseava a água doce. Cultivavam-se o milhete, as figueiras, o pepino, a hena. O gado, vacum e ovino, era abundante. O mercado vivia cheio de gente e nele se pagava em ouro. A população era de vária origem, com bonitas mulheres, de cintura fina e nádegas cheias. E por toda parte havia belos edifícios e casas elegantes.  


BIBLIOGRAFIA
Silva, Alberto da Costa e


A enxada e a lança: a África antes dos portugueses / Alberto Costa e Silva. – Rio de Janeiro: Nova Fronteira; São Paulo: EDUSP, 1992.

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